domingo, 23 de março de 2014


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As influências distintas da genética e da vida familiar estão sempre presentes em suas mentes, contam os casais. “Gostamos de pensar que fazemos diferença enquanto pais”, diz Allyson. Mas aí, no meio de uma conversa, Lily adota uma expressão igual à de Gillian, e Allyson de repente se lembra da gêmea de sua filha. “É sempre uma surpresa”, diz ela. “Às vezes fico toda arrepiada.”

O terceiro componente

O fato de Lily e Gillian serem tão semelhantes, apesar de criadas por famílias diferentes, enfatiza a herança genética partilhada pelos univitelinos. Todavia, para dois irmãos em Maryland, a situação é bem oposta. Embora criados na mesma família, esses gêmeos idênticos não poderiam ser mais distintos. O que poderia ser tão forte que supera o efeito conjunto do inato e do adquirido? “Hoje, no recreio, vi uma nuvem cumulus congestus”, diz Sam, conversando comigo enquanto esperamos seu irmão, John, chegar da escola. “Ela era enorme. Aí ela virou nimbo-estrato.”
Com 6 anos, olhos faiscantes e de óculos, Sam fala como um professor de meteorologia. As nuvens são a sua paixão mais recente. Antes foram os trens, o espaço e os mapas. Nos últimos tempos, ele vem se dedicando a ler pouco a pouco toda uma enciclopédia infantil, recolhendo dados como um esquilo que acumula nozes.
Ambos os gêmeos estão no primeiro ano, mas frequentam escolas diferentes, de modo que John possa receber toda a atenção de que precisa. (Os pais dos meninos pediram que não publicássemos o nome da família.) Quando o ônibus escolar estaciona diante da casa, John corre para dentro, e Sam o recebe com um abraço afetuoso. John ri, mas não diz nada. Quando Sam o solta, ele corre até a caixa com animais de pelúcia. Finalmente, ele está de volta a seu mundo.
Os dois meninos foram diagnosticados como portadores de transtorno do espectro autista pouco antes de completar 2 anos. Os sintomas de John são bem mais graves, incluindo agitação incessante e dificuldades para falar e manter contato com o olhar. Sam tem problemas também, sobretudo de relacionamento. Não surpreende que partilhem esse transtorno de desenvolvimento. De acordo com as pesquisas, quando um gêmeo idêntico é diagnosticado com autismo, há 70% de probabilidade de o mesmo ocorrer com o outro.
Ninguém sabe o que causa tal transtorno, diagnosticado em uma a cada 100 crianças. Embora se considere que fatores hereditários desempenhem papel relevante, os especialistas acreditam que o autismo possa ser desencadeado por fatores ambientais pouco conhecidos. Um estudo de gêmeos realizado em 2011 na Califórnia sugere que as experiências no útero e no primeiro ano de vida talvez tenham impacto relevante.
Para os pais de John, é possível mesmo que tenha ocorrido algo assim. Nascido com um defeito congênito no coração, ele foi submetido a uma cirurgia com 3 meses e meio de vida e, a seguir, tratado com medicamentos fortes para combater uma infecção. “Nos seis primeiros meses de idade, o ambiente de John foi bem diferente daquele vivido por Sam”, conta o pai dos meninos.
Logo depois de Sam e John terem sido diagnosticados, seus pais os inscreveram em um estudo do Instituto Kennedy Krieger, em Baltimore. Amostras de sangue dos meninos foram enviadas a uma equipe, na vizinha Universidade Johns Hopkins, que pesquisava a conexão entre autismo e processos epigenéticos – ou seja, reações químicas desvinculadas tanto dos fatores inatos como dos adquiridos, mas que configuram o que os pesquisadores batizaram de “terceiro componente”. Essas reações influenciam o modo como se expressa o nosso código genético: como cada gene é fortalecido ou debilitado ou mesmo ativado ou desativado para formar os ossos,o cérebro e todos os órgãos do corpo.

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